Esta obra apresenta com um olhar próprio à luz da Teoria das Representações Sociais e das Teorias da Comunicação, como a mídia constrói e reconstrói a imagem dos atores sociais, e de forma particular, a imagem social dos professores e como esta ressignificação reflete na construção da identidade do professor, tornando este texto particularmente importante para compreender e colocar em discussão o lugar do professor em sala de aula. Sem a pretensão de construir um histórico da escola, o texto inicia com uma breve contextualização do ensino situando o leitor neste universo particular. Não me lembro desde quando ouço que o Brasil é um País que não prioriza a educação! Acho que desde sempre, desde a escola primária, desde que estava eu na Universidade como estudante, desde que decidi enveredar pelos caminhos da docência, desde a semana passada quando conversava com colegas professores, desde hoje pela manhã ao concluir a leitura deste livro que tenho agora o prazer de prefaciar. As constatações dos professores Claudomilson e Pedro Humberto sobre a imagem social do professor refletem a identidade aqui identificada de uma profissão desvalorizada que, se ao mesmo tempo não trazem necessariamente uma novidade daquilo que sempre nos ronda como percepção e sensação, ler as comprovações, a partir desta profunda pesquisa e os dados reveladores que este estudo nos apresenta é cruelmente chocante. A imagem que os brasileiros possuem dos professores, reafirmadas pelos meios de comunicação de massa como sendo uma profissão de valor questionável, é algo construído ao longo de anos, não nasce de um
dia para o outro, não se forma como fruto de uma ou outra situação, mas sim como referências de um País onde normalmente as questões básicas de desenvolvimento humano não são levadas a sério, ou pelo menos não são tratadas com a seriedade de um País que quer se firmar como confiável, avançado, desenvolvido, equiparado com os grandes Países que ditam as regras do mundo. O Brasil cresce, mas não avança porque entre o pão e o circo, o supérfluo, o adorno, o que distrai é sempre mais significativo do que aquilo que dá base. Falar sobre educação reporta-nos a pensar também em saúde, transporte e segurança. Todas essas questões são caóticas em um País que se porta com fragilidade diante das sociedades mais desenvolvidas. Seria redundante afirmar que os problemas de saúde, transporte e segurança têm início nos problemas da educação, mas não consigo deixar de pensar que de fato é isso! Ou o Brasil prioriza a educação e tudo o que está relacionado a ela, ou a esteira rolante por onde caminhamos será mais forte que nossos passos e estaremos em constante retrocesso. A educação não é um fim em si mesma, ela nasce de uma sociedade consciente de sua importância e entrega como produto o desenvolvimento traduzido em parâmetros que se refletem em todos os segmentos da coletividade. Estudar pressupõe o tempo de maturação das análises, da pesquisa, da investigação que gera frutos. Nisso somos pobres, paupérrimos. Queremos ser grandes, mas não temos um prêmio Nobel. Em nada! A referência ao Prêmio não é a sua conquista em si, mas a certeza de que a busca por ele faz com que haja uma complexidade de esforços e de tempo de trabalho sério, árduo e contínuo para que os resultados apareçam. Nisso somos rasos, ávidos por resultados imediatos, números enormes de indicadores que nada traduzem, recordistas em estatísticas que só causam impacto em pessoas que ignoram a realidade dos Países de fato
mais avançados, mais desenvolvidos, mais preparados, e por isso ganham prêmios reconhecidos mundialmente. Cláudio de Moura Castro, em seu livro, Educação Brasileira – Consertos e remendos se inquieta ao refletir sobre como o Brasil conseguiu chegar tão longe em seu desenvolvimento sem educação. Isso foi escrito no início da década de 90 e 20 anos depois eu corroboro com essa inquietação. Como conseguimos chegar tão longe? Não sei, como também não sei se admiro essa pseudo conquista. Temos um alto preço a pagar por isso. Em termos sociais estamos no auge de um paternalismo emergencial para sobrevivência daqueles que outrora deveriam estar preparados para conquistar por si mesmo o que as benesses governamentais deveriam ter investido melhor. Os resultados certamente seriam outros, com o presente não desejante de urgências e o futuro com estacas em terrenos não arenosos. A identidade de um professor majoritariamente desvalorizado no Brasil é constatada diariamente na imagem expressada pelos Brasileiros que estudam medicina com professores médicos, mas não querem ser professores, porque buscam um futuro mais promissor. Advogados inquietos por concursos públicos e posições de destaque na profissão para que não precisem acabar em uma sala de aula. Engenheiros, arquitetos, dentistas, economistas que nem imaginam a hipótese de passar anos estudando para no fim ser um professor. Sobre isso, Paulo Freire sabiamente já dizia que ninguém nega o valor da educação e de um bom professor, mas ainda que desejem bons professores para seus filhos, nenhum pai deseja que seus filhos sejam professores. Identidade é aquilo que eu sou e imagem é aquilo que eu sou refletido na perspectiva do receptor, ou seja, a minha imagem sou eu
mais os estereótipos existentes no imaginário de cada um que me vê. Os valores, preconceitos, formas de constituição do mundo que cada um possui fará com que a imagem seja vista com o filtro de considerações de quem analisa a identidade. Devemos lembrar que os conceitos de bom, mau, belo ou grotesco não possuem significado em si mesmo, mas no conjunto de valores sociais reafirmados em cada analista. Assim, a pesquisa sobre a representação do professor na mídia não deixa de ser também uma construção midiática que se não nasce nela, é a partir dela que ganha força e legitimidade porque em uma sociedade de massa é ela quem possui o poder de ditar padrões de comportamento. Dessa forma, a mídia é um dos públicos formadores da imagem do professor e o seu alcance de voz tem o poder de impactar na percepção dos demais públicos constituídos pelos pais, profissionais dos diversos segmentos que possuem o professor como formador de sua profissão, órgãos de classe, políticos e os próprios alunos. O poder do professor sempre foi simbólico e, com o passar dos anos, sofreu alteração sobre a sua importância, mas se hoje podemos identificar uma crise identitária do profissional professor podemos pensar que em algum momento histórico a importância do docente se abalou e muito antes de seguir um caminho de valorização, desviou-se pelo caminho do descrédito. Neste sentido podemos também considerar que ao perder o poder simbólico daquilo que o professor representa como referência social, o seu trabalho passa a não ser mais quantificado como bem intangível e sim como o palpável quantitativo financeiro, ou seja, o dinheiro. A educação passa a ser tratada como mercadoria, objeto de venda e de compra, comércio em que a referência de câmbio não é necessariamente o conhecimento, muito menos a ciência.
Os enfrentamentos de alunos e embates em sala de aula com discussões e relações conflituosas reafirmam esse distanciamento entre alunos e professores do caráter educacional e a aproximação de uma relação de poder mercantil no qual o cliente ao comprar os serviços determina também o pacote de vantagens agregado ao produto final. O discurso acima é generalizado e fruto de uma percepção sobre os professores de uma forma geral, sem distinção de níveis de ensino, região do País ou categoria de oferta de cursos públicos ou privados. Ainda que essa distinção possa ser feitas e que a imagem dos professores que atuam nessas condições possa sofrer alterações, penso que devemos pensar no sistema como um todo, sem destaque para os casos de necropsia ou para aqueles onde existe algum prestígio. Sobre isso prefiro ficar com as palavras de John Donne e, como ele, acreditar que a morte de qualquer homem me diminui, porque eu pertenço à Humanidade. Portanto, nunca procures saber por quem os sinos dobram. Eles dobram por ti (e por mim)!
Simone Antoniaci Tuzzo
Professora Adjunta do Programa de Pós-Graduação em Comunicação (PPGCOM) da Universidade Federal de Goiás- UFG