Peça essencial da fortuna crítica sobre o autor, Jorge Luis Borges: um escritor na periferia chega em boa hora às mãos dos leitores brasileiros.
Publicado originalmente em inglês, em 1993, este é um desafio polêmico à visão corrente – e unânime, demasiado unânime – de Borges como um fabulista soberano que nada deve à história nacional e à tradição literária de sua Argentina de origem.
Beatriz Sarlo é a primeira a reconhecer o tanto que há de “justiça estética” na “universalização triunfal” da obra do autor – mas, suspeitando que nesse reconhecimento vai uma dose de perda, a crítica argentina prefere trafegar na contramão do lugar-comum vigente e providenciar “uma paisagem para Borges”. Não para prendê-lo aos limites de uma literatura nacional, não para devolvê-lo a “um cenário pitoresco e folclórico que ele sempre repudiou”.
Trata-se aqui de resgatar o diálogo do autor portenho com “os textos e os autores a partir dos quais ele produziu suas rupturas estéticas e suas polêmicas literárias”. Isto é: com Dante, Cervantes, Kafka e as Mil e uma noites , certamente, mas também com Sarmiento, Evaristo Carriego, Macedonio Fernández e o Martín Fierro – com vultos e livros que estão longe de pertencer ao cânone ocidental ou universal, mas que solicitaram e mereceram a atenção de Borges ao longo de toda sua vida.
O resultado, de gosto muito borgiano, é o retrato perspicaz de um escritor que, longe de negá-la, converteu sua condição periférica – argentina e latino-americana – em situação privilegiada da qual perturbar as fronteiras entre os gêneros, inverter os fluxos da história literária e perturbar a fundo as noções de local e universal, de centro e periferia.
Samuel Titan Júnior
Beatriz Sarlo nasceu em Buenos Aires em 1942. Ensinou literatura argentina na Universidade de Buenos Aires por vinte anos e, desde 1978, dirige a revista Punto de Vista . Seus livros e ensaios de crítica versam sobre temas como a literatura popular, a indústria cultural, o cinema e a cultura de massas, a memória e a política. No Brasil, publicou Cenas da vida pós-moderna (UFRJ), Paisagens imaginárias (Edusp), Tempo presente (José Olympio), Tempo passado e A paixão e a exceção (Companhia das Letras).