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註釋

Nas últimas décadas, vimos a persistência de fenômenos como a pobreza, a fome, a dificuldade de acesso à saúde e de qualidade na educação, assim como a emergência de debates globais em torno das mudanças climáticas e dos desafios para uma maior aceitação e promoção de diversidade, equidade e inclusão. Em comum, estes desafios se convertem em problemas sociais presentes em diferentes níveis em todos os países, tendo consequências globais e locais. Diferentes atores têm tentado desenvolver iniciativas que nos ajudem a avançar na resolução desses problemas. Tais iniciativas ou soluções também podem ser entendidas como ‘inovação social’. No entanto, tal tarefa está longe de ser simples. 

Nas últimas décadas, mais de uma perspectiva em como solucionar problemas sociais emergiu e foi testada, com diferentes visões sobre quais atores deveriam ser protagonistas nesse processo e qual nível de transformação social podemos atingir. Uma primeira maneira de abordar o tema é comumente associada a atores com grande quantidade de recursos que assumem o papel de ‘responsáveis’ pela realização de projetos. Aqui podemos pensar em ações tradicionalmente conhecidas como ‘Responsabilidade Social’ ou ainda ‘Estratégias na base da pirâmide’. O foco está em utilizar do poder econômico e de influência na cadeia de valor de grandes grupos empresariais para direcionar recursos, capacidades e ações para resolver problemas sociais. Embora a transformação possa ocorrer em alguns casos, aqueles que mais são impactados pelos problemas societais frequentemente são vistos aqui apenas como beneficiários, com pouca margem para desenvolver soluções por eles mesmos. Uma outra perspectiva tem no empreendedor social o ator-chave para a inovação social. Nesse caso, se confia aos atores, que vivem ou não o problema, a responsabilidade de criar organizações que vão enfrentar os problemas sociais. Aqui, podemos pensar em empreendimentos que terão uma missão social (para justificar sua existência) e que buscarão financiar suas operações através de filantropia ou da comercialização de bens e serviços. Podemos ver que a figura do empreendedor   por trás da iniciativa é normalmente exaltada e encorajada. Mais uma vez, a transformação social pode estar presente em diferentes níveis, dependendo do papel conferido pelo empreendedor para os atores que são mais impactados pelo problema. Por fim, podemos pensar em uma perspectiva de inovação social que tenha como ator central aqueles que ‘vivem os problemas’ e que precisariam ter voz e espaços de ação necessários para encontrar soluções por eles mesmos. Normalmente, nessa perspectiva, soluções locais e gerenciadas de forma democrática são privilegiadas. A transformação social é frequentemente o objetivo principal de tais iniciativas, tendo promotores e beneficiários ocupando o mesmo papel.  

Embora o debate em torno dessas diferentes perspectivas seja intenso e os benefícios e limites de cada perspectiva sejam bem documentados, acredito que precisamos dos diferentes tipos de inovação social. Me explico: os problemas societais são complexos e como tal funcionam como um sistema, ou seja, diferentes problemas são interdependentes e uma solução qualquer pode desencadear novos desafios. Por exemplo, ao querer solucionar o problema de pobreza de uma família, programas de empreendedorismo podem encorajar a criação de microempresas que não se preocupem com os impactos sobre o meio ambiente. Se pensarmos em uma região sem infraestrutura para coleta de resíduos ou reciclagem, a consequência de um aumento na produção de bens e serviços pode ser o acúmulo de lixo nas ruas, mais animais em volta do lixo, mais inundações em períodos de chuva e maior probabilidades de vulnerabilidade para certas doenças. Se adicionarmos ao exemplo um contexto em que o acesso à saúde é restrito, as mesmas famílias mencionadas acima podem ser as que sofrerão mais com os novos problemas criados. Sendo assim, entender a inovação social a partir dos tipos de problemas que ela tenta solucionar parece ser fundamental. Dessa forma, as diferentes perspectivas em inovação social podem ter um papel em um ecossistema de soluções, onde a mobilização de diferentes atores, a capacidade de ter objetivos compartilhados e o foco na transformação social são os fatores que tornam o ecossistema de inovação social mais rico e resiliente. É justamente nessa linha que o livro ‘Desvendando a Inovação Social’ contribui. 

Os professores Claudia Bitencourt, Ana Clarissa M. Z. Santos, Manuela Rosing Agostini e Gabriela Zanandrea organizaram uma coletânea de casos que exploram três eixos centrais na área de inovação social: governança, implementação e difusão, transformação e resultados. Os casos cobrem projetos ligados a grandes empresas que buscam ter um maior impacto na sociedade, empreendedores tentando conectar seus negócios a uma missão de impacto socioambiental e atores locais em favelas que usam do turismo para criar oportunidades de trabalho e renda. Além de servir como uma fonte para a consulta de experiências na área de inovação social no Brasil (o que seria um valor em si mesmo), os casos são escritos na forma de caso de ensino, uma ferramenta pedagógica importante e efetiva, utilizada em Universidades de todo o mundo. Casos de ensino permitem a outros professores se apropriarem do material e utilizá-lo com grupos de alunos de diferentes níveis e áreas. Ou seja, além de ser um material rico para os alunos em aula, casos de ensino são uma forma de apoiar professores a utilizar material pedagógico de qualidade para estruturar suas intervenções e basear sua abordagem pedagógica na resolução de problemas. 

Mesmo reconhecendo a complexidade dos problemas sociais com os quais nossa geração e as próximas terão que lidar, bem como a dificuldade em desenvolver soluções ou inovações sociais que terão um impacto relevante, o livro organizado por Claudia Bitencourt, Ana Clarissa M. Z. Santos, Manuela Rosing Agostini e Gabriela Zanandrea nos dá esperança, pois constitui uma peça importante na formação das próximas gerações de gestores pelas universidades no Brasil.